Vale do Silício se prepara para virar a indústria automobilística de pernas para o ar, seguindo o modelo dos negócios digitais

No início da semana, um grupo de analistas do banco Morgan Stanley que passara dias debruçado sobre as planilhas da Apple publicou um achado e tanto. Entre 2012 e 2015, a verba da empresa para desenvolvimento de novas tecnologias triplicou. Saltou de US$ 3,6 bilhões para quase US$ 9 bilhões. E, ainda assim, nada de extraordinário saiu de seus laboratórios neste período. Nem cheiro. No máximo o Apple Watch, um produto de nicho vagamente interessante. Este padrão de gastos em novos produtos não é nada comum no Vale do Silício. É comum, porém, noutra indústria. Em 2015, a Ford investiu US$ 7 bilhões. A Toyota, US$ 9 bilhões.

A Apple está mesmo desenvolvendo um automóvel.

O boato já vem de algum tempo e com boas razões. No ano passado, a Apple contratou Doug Betts, um executivo que passou 25 anos entre Nissan, Toyota e Fiat Chrysler. O que faz na Apple? Exerce uma função operacional não especificada, segundo seu perfil no LinkedIn. No mesmo ano, contratou o engenheiro suíço Paul Furgale, cujo último trabalho havia sido desenvolver carros autômatos. Pelo menos 50 engenheiros que trabalham hoje na Apple vieram da Tesla, a inovadora empresa do Vale que constrói carros elétricos. Elon Musk, CEO da Tesla, já se queixou publicamente da agressividade dos pacotes de bônus oferecidos a seus empregados. Outra empresa atacada é a sul-coreana Samsung. Lá, a Apple busca gente especializada em baterias.

Não bastasse, a empresa comprou um largo percentual da Didi Chuxing, equivalente chinesa da Uber.

As peças todas juntas indicavam, claramente, que havia interesse no mercado automobilístico, mas não necessariamente na construção de um veículo. Poderia ser software, integração de celular, computadores de bordo. A novidade é o alto gasto, o que aponta para um Apple Car.

Não será, evidentemente, a primeira empresa do Vale com este tipo de interesse. Afinal, a própria Tesla já está na terceira geração de automóveis. E a Google tem pronta a tecnologia de seu carro autômato. No início de maio, assinou um acordo com a Fiat Chrysler para o lançamento futuro de uma minivan que dirige por conta própria. Neste mesmo passo, o presidente da Ford vem dando entrevistas dizendo que sua indústria está preparada para o desembarque do Vale. A concorrência vai aumentar.

Quando o Vale começar a fazer automóveis, as mudanças serão radicais. Porque os dois novos conceitos trazidos pelo digital, quando vistos em conjunto, representam uma drástica mudança de comportamento. Trata-se do modelo Uber, de chamar um carro pelo celular, e dos robôs.

Poderemos chamar o carro, pelo celular, a hora que precisarmos dele. E, se pudermos fazer isso, qual o sentido de comprar um automóvel? A principal aposta dos analistas é que deixaremos de ter nossos próprios veículos para simplesmente contratar o serviço de uma empresa. A Uber do futuro talvez tenha um modelo parecido com o do telefone celular. Paga-se uma quantia por mês por um pacote de quilômetros. Quem passar daquele número, paga mais.

Há inúmeras vantagens nesse modelo. O número de acidentes diminui, carros autômatos são muito mais seguros. Carro é coisa muito cara, cujo valor deprecia rápido. Essa perda desaparece. O problema de onde estacionar some. Num cenário com só carros robôs na rua, a velocidade tende à constância, e os engarrafamentos se resolvem. Além do que, é perfeitamente possível usar um carro pequenino para o trabalho e pedir um com bagageiro grande para o veraneio do fim de semana.

Mesmo em Detroit, onde está a indústria tradicional, não são poucas as mentes pensando nesse modelo para o futuro. É mais um negócio que o digital botará de pernas para o ar.

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