O futuro digital envolve muitas promessas e também enormes incertezas, de acordo com o Relatório Global da Internet, elaborado pela Internet Society (ISOC), organização global sem fins lucrativos, dedicada ao desenvolvimento aberto da internet.

Intitulado “Os caminhos para o Futuro Digital”, o relatório examina a internet entre os próximos cinco a sete anos e identifica os fatores que moldarão o seu futuro. O estudo revela uma série de desafios e oportunidades da rede mundial para a próxima geração e traz recomendações sobre as medidas que podem ser tomadas atualmente para realizar a velha promessa de que a internet é uma rede para todos, e em todos os lugares.

O relatório considera as muitas forças que dão forma à internet hoje em dia, da inteligência artificial (IA) às ciberameaças, passando pelos padrões da internet, pela Internet das Coisas (IoT) e inclusive pela economia da internet e pelo crescente papel do governo. O estudo explora como essas forças vão impactar áreas-chave, incluindo divisões digitais, liberdades e direitos pessoais, bem como a mídia e a sociedade. 

O documento mostra que a implantação avançada da IoT e IA transformará economias e sociedades inteiras nos próximos anos através da automação e da convergência entre os mundos físico e digital. Esta transformação vai mudar a natureza da divisão digital como foi historicamente definida – ou seja, aqueles que têm acesso à internet contra os que não têm.

Embora muitos membros da comunidade global da Internet Society tenham compartilhado sua visão de que a internet enfrenta um período de mudanças sem precedentes, eles também reafirmaram sua crença nas principais ideias que moldaram a rede até os dias atuais.

“Nossa extensa pesquisa aponta claramente que, assim como na época da fundação da Internet Society, há 25 anos, as pessoas ainda mantêm os valores fundamentais da internet em alta consideração, de que a rede deva ser global, aberta e segura”, afirma Sally Wentworth, vice-presidente de Políticas Globais da Internet Society.

Muitos dos pensamentos expressados no estudo ilustram uma convicção forte sobre o potencial da internet em continuar trazendo mudanças positivas para a vida das pessoas. Os participantes do relatório ressaltaram o crescimento de novas tecnologias e aplicações como evidência deste poder da internet, nunca visto antes. A web promove inovações e benefícios, e a sua conectividade pode oferecer educação, saúde, prosperidade econômica e mudanças sociais.

No entanto, essas esperanças e crenças são contrariadas no documento por temores crescentes de que a internet possa ser vista e utilizada de uma forma diferente no futuro. Por exemplo, há preocupações de que sejam feitos esforços para restringir as liberdades da Internet por meio de centralização, vigilância em massa e fragmentação. Há preocupações sobre maiores dificuldades na navegação e com o fato de que a separação entre realidade e ficção possa se tornar cada vez mais difícil.

Alguns estão preocupados com a ameaça de novas divisões e como isso não vai só aprofundar as disparidades existentes entre os países, mas também dentro de uma própria sociedade. Em particular, o estudo explora o surgimento de uma nova divisão de segurança e de confiança, implementada por conta das ameaças cibernéticas que continuam se multiplicando e criando uma fenda crescente entre os usuários conscientes da segurança e aqueles que não possuem habilidades, conhecimento ou recursos para se protegerem online.

“Nós descobrimos que as pessoas compartilham um senso tanto de otimismo quanto de desilusão sobre o futuro da internet, em igual medida. Embora não haja garantias do que está por vir, sabemos que a humanidade deve ser o centro da Internet de amanhã. Ela precisa continuar beneficiando as pessoas e criando novas possibilidades sociais e econômicas, para cumprir a premissa sobre a qual foi construída. Devemos prestar atenção às advertências contidas neste estudo e começar a tomar ações imediatas, que ajudarão a manter a Internet funcionando no futuro para todas as pessoas e em todos os lugares”, acrescenta Wentworth.

Algumas das principais conclusões contidas no relatório incluem:

. IA e IoT alteram vidas, mas podem resultar em uma “sociedade de vigilância”

A inteligência artificial (IA) e a Internet das Coisas (IoT) possuem enorme potencial para simplificar e melhorar a vida das pessoas – mas somente se as considerações éticas orientarem o desenvolvimento da tecnologia e guiar o seu uso. Como a IA e a IoT permitem a coleta de grandes quantidades de informações pessoais, há o risco de que, sem as proteções apropriadas e o controle de usuários, uma “sociedade de vigilância possa emergir”.

. O aumento das preocupações sobre segurança pode prejudicar as liberdades e os direitos pessoais

As questões envolvendo a segurança cibernética vão impulsionar as discussões sobre a governança da Internet num futuro próximo, com os governos sendo pressionados a tomar decisões que podem prejudicar a governança global, aberta e distribuída da internet. Medidas que podem ser direcionadas à proteção do ciberespaço também podem prejudicar as liberdades e os direitos pessoais. Sem uma mudança de curso, as liberdades online podem estar perto de um ponto de declínio irreversível.

. O papel do governo na tomada de decisões na Internet será expandido à medida que a Internet penetra em todos os aspectos da vida humana

Numa economia hiperconectada, nenhum segmento permanecerá intacto em relação à tecnologia – hospitais, empresas de transporte, empresas de fabricação, etc. – e apenas aqueles que se adaptarem rapidamente às mudanças tecnológicas serão bem-sucedidos. Os governos e a sociedade, de modo geral, precisarão se adaptar rapidamente à nova economia e aos desafios políticos.

. A Internet pode tornar os governos mais responsáveis, mas também mais poderosos

Ao mesmo tempo em que os governos se tornam mais responsáveis perante aos cidadãos, graças à transparência e ao livre fluxo de comunicações que a Internet traz, novas ferramentas que ameaçam os direitos fundamentais também estão disponíveis para eles. À medida que a internet “empodera” cidadãos, as tentações para os governos desligarem a Internet ou negarem o acesso vão crescer.

. A natureza da divisão digital vai mudar

À medida que a Internet transforma todos os setores da economia global, as divisões digitais do futuro não estarão apenas relacionadas ao acesso da Internet, mas também sobre a lacuna entre as oportunidades econômicas disponíveis para alguns, mas não para outros. O vínculo entre segurança e prosperidade econômica crescerá, levando ao potencial de uma divisão de segurança que separa aqueles indivíduos ou países que podem proteger seus ativos digitais daqueles que não podem.

Recomendações

Para se proteger da possibilidade de um futuro digital definido por estes e outros conceitos, o estudo descreve recomendações-chave para empresas, organizações de advocacia, governos e outras partes interessadas em considerá-lo como parte de sua tomada de decisões relacionada à Internet:

1) Os valores humanos devem impulsionar o desenvolvimento técnico e a utilização

2) Aplicação de direitos humanos online e offline

3) Posicionamento dos interesses dos usuários em primeiro lugar, antes de seus próprios dados

4) Agir agora para fechar as divisões digitais

5) Fazer com que a economia da Internet funcione para todos

6) Criar uma abordagem colaborativa para a segurança

7) Aumentar a responsabilidade para as pessoas que manipulam os dados

8) Construir redes fortes, seguras e resilientes

9) Abordar a necessidade de normas sociais online

10) Capacitar as pessoas para moldar os seus próprios futuros

O documento também oferece recomendações mais específicas para cada um destes dez tópicos, com o intuito de ajudar a reconstruir a confiança na Internet e garantir que os usuários, indivíduos e cidadãos do futuro possam se beneficiar plenamente das oportunidades socioeconômicas que a Internet possa oferecer.

METODOLOGIA

O Relatório Global da Internet foi desenvolvido através de pesquisas realizadas pela Internet Society e sua comunidade global, ao longo de um período de 18 meses, desde o início de 2016. Três pesquisas globais, duas regionais e dez mesas de discussão fizeram parte do estudo, somadas às entrevistas com mais de 130 especialistas da Internet que representam o governo, o setor acadêmico, organizações internacionais, negócios e organizações não governamentais.

Fonte: ComputerWorld